quarta-feira, março 14, 2007

gente da cultura em vez de Gente com Cultura




Pois é. O Pinamonti foi corrido como se despede uma sopeira. É a gente que temos, que é que esperam.

Este caso leva-me a algumas reflexões.

Como entrada e como repararam coloquei um vídeo do muito nosso Gino Bechi. Para quem não saiba trata-se de um dos melhores barítonos europeus do século XX. Fez carreira um pouco por todo o mundo. Nos anos 60 correspondeu a um convite de Serra Formigal e veio para Portugal durante quase 20 anos. Foi o mestre que faltava para a melhoria substancial do nosso canto lírico. A sua acção em S. Carlos e no Trindade (da extinta FNAT) foi primordial. Mas estávamos em plena "noite obscurantista e fascista". Calculem o topete. Salazar queria dar Cultura ao Povo. Como dizia António Silva no Pátio das Cantigas "A ópera é a música para operários"...

Mas estes brilhantes democratas não brincam em serviço. O que servia para o fascismo não serve para eles. Sim porque eles são bestialmente anti-fascistas!

Uma das suas principais e primordiais acções pós 25 do 4 foi acabar com a Companhia de Ópera que estava na FNAT. Era música elitista. (hoje todos choram baba e ranho...)

Agora foi a vez de Pinamondi. Então não é que o gajo não dobrava a cerviz à sora doutora ministra ou lá o que é!. Rua com o bicho que não faz cá falta nenhuma. Vem outro, desta vez alemão, qualquer serve, dizem eles...

Pinamondi relançou a ópera em Portugal. Esta é a realidade. Pode-se não gostar (como não gostei) de certos encenadores que trouxe para Portugal. Confesso que só consegui ouvir o Parsifal e as Valquírias com os olhos fechados, recusando-me totalmente a olhar para os neons e plásticos que se amontoavam pelo palco. Como invejei os músicos da OSP que, colocados no fosso da orquestra, só se deliciavam com a música de Wagner sem conseguirem ver o que se passava no palco.

No entanto Pinamondi teve algumas genealidades. O Boris Goudonov que vi há 4/5 anos em S. Carlos, com uma encenação bem moderna, foi dos momentos inesquecíveis para qualquer melómano e amante da ópera. Era uma encenação digna dos melhores palcos mundiais. Acreditem que é verdade. A sua permanente aposta na Ópera portuguesa foi também uma surpresa e das mais agradáveis.

Pois é mas o que é bom acaba-se. A ministra e mais o seu secretário de estado (gentes da cultura) acharam - em nome das medidas de austeridade aparente em que vivemos, alterar toda a organização artística de S. Carlos e da Companhia Nacional de Bailado. Vamos por um lindo caminho e sobre isto voltarei a falar.

Não é também despiciente falar das grandes medidas que não devem tardar a nível do ensino artístico em Portugal. Ou eu me engano muito ou o ensino artístico laboriosamente trabalhado e planeado ao longo de décadas vai pelos ares. E não culpem a Al Qaeda!

A última reflexão. Em períodos eleitorais todos os principais partidos da nossa praça vão buscar "gente da cultura" ( e aqui incluem-se também os actores de telenovelas...) para apresentarem aos pacóvios eleitores como trunfos da sua magnitude enquanto políticos. Essa gente desempenha o papel das lebres e faisões dependuradas nas cartucheiras dos caçadores. A de troféus!

Mas isto tem uma contrapartida bem negativa. Os políticos ao quererem dessa gente tem de lhes dar sinecuras, o que impede que a lógica funcione. Ou seja explicando melhor. Os políticos para servirem o povo que os elege deveriam procurar Gente com Cultura e não gente da cultura.

Uma última observação. A maneira como os ministros da cultura deste país tratam os secretários de estado. Carrilho fez o que fez a Rui Vieira Nery. Esta faz e continua a fazer o que quer de Mário Vieira de Carvalho. Pelo menos o Nery teve uma coluna bem menos aborrachada que o actual

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