O NAUFRÁGIO DE MACAU
Para a Teresa Bernardino
A derradeira nau,
Partindo o leme e o velame roto,
Naufragou em Macau,
Por traição do piloto.
E fora a mais leal:
Em quatro séculos hasteara à ré
O pavilhão de Portugal,
Para glória do Império e defensão da Fé.
E era santo dos santos o seu nome,
Mas erguia na gávea o demo de vigia
Que sem um renegar que o vença e dome
A faz varar na vaza desta maré vazia.
Tripulou-a Camões
Que ali lembrou, previu: — Dos Portugueses,
Com seus profanos corações,
Houve traidores algumas vezes.
Tripulou-a Pessanha,
Murmurando entre névoas de ópio e olvido,
Como quem num queixume e presente desdenha:
“Eu vi a luz em um país perdido.”
Da última da Armada
Que em novos mares buscou cada porto ignorado;
Da jamais apresada,
Tendo ao pirata vil o fuzil apontado,
Hoje como não resta nada
Mais do que o pranto da História e a raiva do meu brado:
— Quem impede o traidor de morrer enforcado?
António Manuel Couto Viana
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