Não devemos ter medo de ler Marx. Eu nunca tive. E se a generalidade das suas análises e propostas para mim tem o pouco valor da sua datação e rigor filosófico pouco consistente, coisas há que nos devem servir de motivo inspirador.
Vamos buscar um pouco do melhor de Marx para analisarmos a situação do novo "proletariado europeu".
Com efeito com o aparecimento do capitalismo, ou melhor dizendo, com o momento em que passou a ser o "valor de troca" que determinou o "valor de uso" (ao contrário do sistema anterior) tudo se entornou. Marx explica-o bem.
Vem isto a propósito do que eu chamo o "novo proletariado europeu".
E senão vejamos.
Nas teorias dos corpos intermédios que dominaram as doutrinas "contra-revolucionárias" dos séculos anteriores, todo o Homem não é uma ilha. Pertence, está integrado, é herdeiro de uma cultura e de uma civilização, está protegido num sistema transpersonalista em que a comunidade (enquanto unidade de defesa da "pessoa") desempenha o papel integrador e defensor de todos os seus componentes: o Homem subordina-se livremente à sociedade e sabe, de antemão, que a comunidade o protegerá. Ele sabe que a comunidade tem direitos, e que os seus direitos (chamemo-hes individuais) só serão válidos desde que inseridos na própria comunidade.
Hoje tudo isto está ultrapassado e vencido. Até no mundo rural o "comunitarismo" desapareceu. é só para turista ver e etnólogo publicar estudos!
Caiu-se, pois, numa sociedade completamente (só aparentemente) personalista. Pelo menos essa é a doutrina oficial que nos vendem. Os valores dos direitos dos homens, etc e tal.
Mas tal facto não corresponde à realidade.
Hoje, no século XXI, e guardando todas as proporções, cada vez mais nos assemelhamos ao proletariado do século XIX. Recordemos que nessa época o proletário era o trabalhador (asfixiado pelo sistema capitalista triunfante em toda a linha) que vivia na insegurança total: económica, alimentar para ele e para os seus filhos, sem ligação ao seu grupo familiar, que abandonou a agricultura de sol a sol para as "luzes" da cidade para trabalhar repetitivamente de antes do nascer do sol até depois do sol se por.
O proletário - e isto não é o choradinho de Dickens e quejandos - vivia o dia a dia, (sem esperança de nada a não ser sobreviver até ao dia seguinte) era uma peça na engrenagem (descartável) a qualquer momento. Era só poeira humana como denunciado, na época, por Tocqueville e Renan, antes que Charles Maurras aprofundasse as suas teses.
Estão a ver o filme do triunfo dos porcos liberais?
Neste ocidente e este ocidente inclui, claro, os EUA - grande, enorme acelerador de todas as doenças da Europa - o homem de hoje (e principalmente o de amanhã) será o deserdado de todas as heranças e tradições, de todos os seus laços naturais, de todas as suas fidelidades. Nada o ligará a nada a não ser o seu aparente prazer dado pelo consumismo desenfreado.
Será o escravo não do patrão odioso e identificável do século XIX, mas sim do publicista que lhe impõe consumos desnecessários e tolos.
Ou seja deixará de ser a unidade produtora do século XIX para passar a ser a unidade consumidora do século XXI.
E quando se acabar este "paraíso" consumista, insustentável a médio e longo prazo, aterrará na realidade e, sem nada que o apoie (dos tradicionais cimentos sociais) e será indubitavelmente presa fácil dos novos patrões (não ocidentais) que ocuparão, então o espaço livre. Sim porque em geo política há um horror comum: o horror aos espaços vazios!
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