segunda-feira, setembro 10, 2007

O que aconteceu a 7 de Setembro



Nesse dia, Mário Soares e Samora Machel concluiram em Lusaca o calendário para a independência do território. O ministro dos negócios estrangeiros português (Mário Soares), sempre pressuroso em agradar aos seus interlocutores, alargou-se em generosidades e insistiu em não apresentar quaisquer condições que aquietassem o terror que se ia apossando de todos os moçambicanos hostis à entrega do poder a um movimento armado, ultraminoritário e comunista. Divulgado o acordo para a transmissão de poderes, realizou-se nos arrabaldes de Lourenço Marques um ajuntamento da FRELIMO, no termo do qual se deram largas ao ódio anti-português. Pontificaram nas arruaças membros do grupo "Democratas de Moçambique", maioritariamente ligados ao advogado e milionário Almeida Santos.

A bandeira portuguesa foi arrastada num camião pelas ruas perante a população. Foi o rastilho. Sem que aqueles que estavam a preparar activamente a resposta dessem por isso, ou sequer a planeassem milhares de pessoa de todas as etnias ocuparam o aeroporto, a estação do Rádio Clube de Moçambique, as redacções dos jornais e conglomeraram-se numa imensa massa humana nas principais artérias da capital. As autoridades que tinham tomado conta "disto" atacaram de imediato os portugueses revoltados, com ameaças muito explícitas. O PS e o PCP emitiam comunicados que não deixavam qualquer margem para contemporizações. O PS afirmava sem rebuço: "não pode admitir-se que uma minoria de reaccionários impeça o caminho do povo de Moçambique para a sua própria libertação. (...) A descolonização portuguesa constitui uma forma nova, original e revolucionária, sem paralelo em experiências estranhas, de formar uma aliança de povos senhores dos próprios destinos e livres da ingerência das superpotências" (in República, 10.09.1974). O PS ainda fazia ainda parelha com o PCP nesse conturbado Setembro em que Spínola, cada vez mais patético do alto da sua arrogância autista, pedia que a "Maioria Silenciosa" se pronunciasse.

Samora Machel e alguma "tropa fandanga" portuguesa puseram-se de acordo e decidiram agir. Spínola enviou ameaças aos líderes da revolta portuguesa, insinuando que se fosse preciso mandava a aviação bombardear o Rádio Clube de Moçambique. Diz-se (Jorge Jardim, in Moçambique Terra Queimada e Clotilde Mesquitela- 7 de Setembro) que Soares terá pronunciado a terrível ameaça: "se for preciso, atirem-nos [aos revoltosos] ao mar".

A jornaleiragem de Lisboa tentou por todos os meios escamotear a dimensão do movimento, imputando-o a uma minoria sem expressão. Contudo, a revolta foi colectiva, cobrindo a quase totalidade das minorias branca e asiática, a quase totalidade dos miscigenados e vastos sectores da população negra. A liderança do movimento englobava muitos dirigentes negros importantes - Joana Simeão (Macua), Kavandame (Maconde), o pastor Uria Simango, mas também Grilo (ex PCP), Neves Anacleto (avô do Louçã), etc. Ou seja muita gente - chefia nenhuma. E quando digo que não havia chefia, significo com isso que não havia ninguém reconhecidamente capaz de agregar o autêntico "melting pot" surgido expontaneamente nessa data.

A Manuel Gomes dos Santos, que comandava a RCM, faltava-lhe a capacidade política para definir rumos e estratégias. Gonçalo Mesquitela não pode assumir a direcção do movimento por ser considerado próximo do anterior regime. Ou seja toda aquela gente (menos os nossos - que já não tinham qualquer dúvida sobre ele) esperava por Jorge Jardim.

A partir do dia 9 (nesse dia chegaram tropas da Frelimo de avião, vindas da Tanzânia) e, com o apoio (ou a cumplicidade por pura omissão das FFAA "portuguesas"), começou a vingança dos comunas. Centenas de mortos. Violações. Roubos e destruições. No dia 9, transportados de avião, chegaram aos subúrbios de Lourenço Marques os primeiros efectivos da FRELIMO.

O movimento esboroava-se. Continiuava à espera do D. Sebastião: Jardim (que nunca mais vinha, pudera...)

Machel, de Dar-es-Sallam, estimava que os "vagabundos e criminosos" (A Capital, 10 de Setembro 1974) seriam esmagados, no preciso momento em que o Vitor Crespo, assumia em Lisboa as funções de Alto Comissário Geral de Moçambique.

No preiamar das matanças e desmandos, Rui Knopfli, director de A Tribuna de Lourenço Marques, açulava: "esses grupos activistas são compostos por filhos de família, ex-comandos e um sector da pequena burguesia comerciante, que por ignorância se deixaram arrastar nesta aventura".

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