quinta-feira, setembro 20, 2007

A PERFEITA ACTUALIDADE O MANIFESTO SOBRE A PÁTRIA



Recordei ontem o tão esquecido Movimento 57.

Hoje vou transcrever parte (é muito longo) do seu “Manifesto sobre a Pátria” (merece leitura atenta - recomendo-a vivamente) publicado no número 2 , de Agosto de 1957, na revista 57.

“Aboliram a palavra do vocabulário e fecharam-na no recôndito mais profundo do subconsciente. Conhecem-na tanta como a receiam. Sabem que ela está lá, no seu lugar de exílio, sempre estranhamente viva, sempre estranhamente desperta. Dir-se-ia uma palavra mágica que eles têm medo de pronunciar, não vá ela por em movimento insuspeitadas forças. Se a encontram ao acaso de uma leitura, logo a repudiam com um frémito de ódio, de vergonha ou apenas de intranquilidade. ...

... nós também não temos medo de a dizer: porque é na Pátria e pela Pátria que o nosso destino será mais do que um esbracejar sem sentido na lama do quotidiano. Esta é a ditosa Pátria minha amada: Camões poderia continuar a ser o amável cantor de versos líricos, mas quando viu a Pátria Imperial alvitada pela ambição, pelo ouro, pelo amolecimento do ideal, deu-nos os Lusíadas e ensinou-nos que uma Pátria é uma razão viva a mover-se para um fim e não um aglomerado de interesses egoístas....

E Fernando Pessoa? ... Quanto não disseram para renegar a Mensagem, a nossa terceira grande epopeia e a maior teoria poética e transcendental da história portuguesa, para o último lugar, para trás de todas as expressões líricas a que Fernando Pessoa, como Camões, havia confiado a amargura e a angústia do seu isolamento, que levara aos limites extremos a situação antropológica do homem moderno, perdido de qualquer tradição ou e qualquer movimento teleológico.

Reconciliando-se com a tradição, reconciliando-se com o movimento teleológico da Pátria, que justamente procuravam diagnosticar e impulsionar, o indivíduo – Camões, o indivíduo – Junqueiro, o indivíduo - Pessoa, resolveram em “os Lusíadas”, em “A Pátria” e na “Mensagem” aquela perturbação lírica que neles, como nos grandes poetas, não é senão o choro imóvel perante os sofrimentos da condição humana.

No nível mais alto, que é o nível epopeico, os nossos épicos antigos ou contemporâneos aprendem enfim que, se esses sofrimentos se podem transcender, é pela acção, pelo movimento, pela viagem em direcção a um fim no qual o homem se possa redimir. Aqui reside o carácter específico e absolutamente original do génio épico português....”

(Continua)

Nota: Ao transcrever para o ficheiro este Manifesto relembrei-me de um facto que ainda hoje me vem vastas vezes à memoria com grande desprazer, para não dizer pior.

Numa das homenagens a Rodrigo Emílio, lírico de excepção, mas épico de igual ou maior valia, ouvi (em conversa final e informal) de um dos destacados membros da “inteligência” deste país presente na sala - e que fez uma das mais tristes intervenções recordatórias do nosso Rodrigo - as seguintes palavras: “temos de colocar alguém a ver toda a produção do Rodrigo e republicar toda a sua obra lírica, que o resto é para esquecer...”.

Garanto-vos que não saltei logo por deferência para com a Terá e demais família do Rodrigo. Mas que cá ficou, ficou.

Revejo agora que estas atitudes já estavam bem descritas 50 anos antes.

E que as palavras do Manifesto têm uma actualidade absoluta e permanecente.

É também por isso que voltarei ao tema.

4 comentários:

Flávio Gonçalves disse...

Se não se importar vou transcrever o que puder do seu blogue para a http://pt.metapedia.org

josé carlos disse...

Não me importo nada. Esteja à vontade. Se eu tivesse tempo escreveria algumas coisas para lá. Pode ser que um dia eu esteja com mais tempo...

Obrigado

Anónimo disse...

Postais assim são colírio para os olhos,música para os ouvidos e alimento para a alma!

Anónimo disse...

"Hoje vou tanscrever parte (é muito longo) do seu 'Manifesto...'"

Muito bem. Diria antes, excelente. E para quando o resto desta preciosa transcrição? Espera-se e deseja-se.

Renovo-lhe os meus parabéns por este Blog.
Maria