O romance Les Septs Couleurs é, com exactidão, o romance de uma juventude que não tendo ainda determinado o seu futuro se vê perante esse futuro de modo a ser obrigada a tomar partido. A primeira parte, escrita no género popularizado do récit, começa numa pensão heterógenea — a pensão Souris — onde se encontram as personagens que depois serão o corpo da história. É aí que reside Patrice. É aí que o visitará, às vezes, Catherine. A acção tem início em 1926. Os filmes em voga que ambos vêem ou que ambos discutem são o En Rade, de Cavalcanti, o Variétés, o Jazz, o Rapaces e La Charrette Fantôme tirado de um romance de Selma Lagerloff. O actor em voga é Rudolfo Valentino e o cinema preferido o Vieux Colombier. Em literatura, firma-se com o prestígio da novidade a Nouvelle Revue Française e a moda literária à cette époque naïve était aux voyages et à l‘évasion. Eis porque Patrice e Catherine decidem seguir a seu modo as directrizes epocais — décidait ensemble de la suivre, de voyager dans Paris, de s‘évader en eux-mêmes —.
Um terno fio de amor sem consequências os une na mesma aventura maravilhosa de viver a juventude. E é essa juventude que se apercebe do drama dos mais velhos que foram ter à Pensão Souris como navios cansados a um porto de abrigo: essa velhice, porém, não os ensombra. Para eles, há apenas a maravilhosa vivência do dia a dia claro da sua mocidade. Vivem a mocidade numa posse mútua que é a possession dans la puretê. São simples, imaginosos e livres. Por isso a vida os vai separar, determinando o destino diferente de cada um deles, destino que quando volte a pô-los frente a frente já não os deixará reconhecer. Patrice parte para Itália como professor particular e em Itália descobre um comportamento novo, o Fascismo. A descoberta diária que a sua juventude vai fazendo do rejuvenescer italiano é mencionada em cartas sucessivas para Catherine, que vive numa surdina longínqua. É a segunda parte do romance, em que o estilo escolhido é o epistolográfico. Uma saudade existe nesta separação: o não terem visto juntos um filme que empolgou a juventude, O Couraçado Potenkine. Pensam ainda que o hão-de ver. Mas quando? Catherine participa-lhe o despertar de um novo amor, Courtet, amor que a separação motivou ou tornou possível. Ficará o passado, ficarão as cartas, essas que são des miroirs si imparfaits que nous n‘avons de nous qu‘une idée fragmentaire.
O romance entra em novo ritmo. Patrice vai para Marrocos e enfileira na Legião Estrangeira, onde vai conhecer um alemão que constituirá o complemento do apelo à heroicidade que a Europa Nova traz consigo e que o velho mundo liberal não pode comportar. A amizade que liga Patrice a Siegfrid Kast terá consequências. E estas estão marcadas no novo ritmo escolhido por Brasillach — o Journal — diário íntimo em que assistimos ao moldar de uma personalidade e ao amadurecimento de um corpo. O tempo passa-se na caserna em mútuas confissões. Fala-se da Alemanha, das anedotas políticas do Nazismo que vem para o grande tablado da política mundial, da necessária compreensão entre os povos. A guerra de Espanha estala. Em França governa a balbúrdia da Frente Popular e as fotografias que chegam a Marrocos dos acontecimentos franceses lembram a Patrice as imagens da revolução russa, aquela revolução que ele não viu no filme sobre o couraçado Potenkine... É então que tudo o encaminha para a juventude despreocupada do passado: até ao encontro com um dos comparsas da pensão Souris, Sénèque, que o faz retornar aos vinte anos, quando ele ainda não tinha tomado partido. Mas é aqui que surgem as páginas mais vibrantes do Journal: a partida de Patrice para Nuremberga, onde assistirá ao congresso das Juventudes Europeias. É uma féerie de cores, de cânticos, de fraternal camaradagem; é aí que veremos a aparição de Hitler, é aí que regressará à juventude empolgado pela juventude da Nova Alemanha, é aí que descobrirá uma nova mulher que preencherá o vazio do seu passado sentimental, Lisbeth. Mas essa Lisbeth não vai avivar esse passado?
Novo andamento dramático que se realiza em diálogo teatral. Catherine e o marido vão discutir o passado e o presente. Ele está também empolgado pela jovem Alemanha, mas num plano diferente do de Patrice. Para trás ficaram as Réflexions; agora é apenas a vida sem máscara. E é essa vida sem máscara que altera os destinos. Courtet vai meter-se como voluntário na guerra de Espanha, pois ali se jogam os destinos dos homens que acreditam ainda na Europa ou a renegam. Ele acredita e por isso se vai bater com o nome suposto de Herbillo. É no seu espólio que se encontrarão os Documentos — recortes de jornal — em que encontramos as ideias do autor desse espólio e a marcação dos nacionalismos que renascem em toda a Europa rejuvesnecida. E Herbillo ou Courtet é ferido. No hospital pretende saber de sua esposa, último documento deste andamento.
O derradeiro encontro de Catherine consigo mesma dá-se no comboio em que ela segue a caminho do hospital em que o seu marido está internado. É o encontro com a sua adolescência frustrada, mas é também o encontro com a vida. A adolescência com Patrice fora fraterna. A vida com Courtet fora apenas a vida. Por isso ela ia ao encontro dessa vida com este sentido, em diálogo interior: “Comme en pense que toute la vie on va rouler ainsi à travers les loumièrs tournantes, sur ces rails lisses et invisibles, un peu de sueur aux épaules, dans l‘odeur de la poussière, du drap tiède et du charbon, engourdi sans effort pour lever les paupières et livré sans défense à toues les images de la vie”.
A acção termina em 1939.
1 comentário:
Meu caro,
Não sei como exprimir o quanto agradeço estas lições sobre a obra de RB.
Receio que 8 postais não sejam suficientes.
Ainda falta tanto ...
Pessoalmente, aguardo o NOTRE AVANT GUERRE e muito LA CONQUÉRANTE.
E faltam os POÈMES DE FRESNES.
«Pendant ce temps, à Fresnes, comme il changerait le plomb en or, Brasillach changera sa souffrance en poésie religieuse» escreveu a Anne Brassié na magnífica biografia «Robert Brasillach ou Encore un instant de bonheur».
Merece também um postal.
Força.
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